domingo, 22 de julho de 2007

Via Láctea

- Ora (direis)Ouvir estrelas! Certo,
Perdestes o senso! E eu vos direi, no entanto,
Que, para ouví-las, muitas vezes desperto
E abro a janela, pálido de espanto.

E conversamos longo tempo, enquanto
A Via Láctea, como um pálio aberto,
Cintila. E, ao vir o sol, saudoso em pranto,
Ainda as procuro pelo céu deserto.

Direis agora: - Tresloucado, amigo!
Que conversas com ela? Que sentido
Tem o que dizem quando estão contigo?

E eu vos direi: - Amai para entendê-las,
Pois só quem ama pode ter ouvido
Capaz de ouvir e entender estrelas!


Olavo Bilac

"­Tempo Perdido"

"Todos os dias quando acordo,
Não tenho mais o tempo que passou
Mas tenho muito tempo:
Temos todo o tempo do mundo.

Todos os dias antes de dormir,
Lembro e esqueço como foi o dia:
"Sempre em frente,
Não temos tempo a perder".

Nosso suor sagrado
É bem mais belo que esse sangue amargo
E tão sério
E selvagem.

Veja o sol dessa manhã tão cinza:
A tempestade que chega é da cor dos seus
Olhos castanhos
Então me abraça forte
E me diz mais uma vez
Que já estamos distantes de tudo:
Temos nosso próprio tempo.

Não tenho medo do escuro,
Mas deixe as luzes acesas agora,
O que foi escondido é o que se escondeu,
E o que foi prometido,
Ninguém prometeu.

Nem foi tempo perdido;
Somos tão jovens"

sábado, 21 de julho de 2007

Dois loucos no bairro

um passa os dias
chutando postes para ver se
acendem
o outro as noites
apagando as palavras
contra um papel branco
todo bairro tem um louco
que o bairro trata bem
só falta mais um pouco
pra eu ser tratado também



Paulo Leminski

Metade

Que a força do medo que tenho
não me impeça de ver o que anseio
que a morte de tudo em que acredito
não me tape os ouvidos e a boca
pois metade de mim é o que eu grito
mas a outra metade é silêncio.

Que a música que ouço ao longe
seja linda ainda que tristeza
que a mulher que eu amo seja pra sempre amada
mesmo que distante
porque metade de mim é partida
mas a outra metade é saudade.

Que as palavras que falo
não sejam ouvidas como prece nem repetidas com fervor
apenas respeitadas como a única coisa
que resta a um homem inundado de sentimento
porque metade de mim é o que ouço
mas a outra metade é o que calo

Que essa minha vontade de ir embora
se transforme na calma e na paz que eu mereço
que essa tensão que me corrói por dentro
seja um dia recompensada
porque metade de mim é o que penso
e a outra metade um vulcão.

Que o medo da solidão se afaste
que o convívio comigo mesmo se torne ao menos suportável
que o espelho reflita em meu rosto um doce sorriso
que me lembro ter dado na infância
porque metade de mim é a lembrança do que fui
e a outra metade não sei

Que não seja preciso mais que uma simples alegria
pra me fazer aquietar o espírito
e que o teu silêncio me fale cada vez mais
porque metade de mim é abrigo
mas a outra metade é cansaço

Que a arte nos aponte uma resposta
mesmo que ela não saiba
e que ninguém a tente complicar
porque é preciso simplicidade pra fazê-la florescer
porque metade de mim é platéia
e a outra metade é a canção

E que a minha loucura seja perdoada
porque metade de mim é amor
e a outra metade também.


(Oswaldo Montenegro)
Cantiga de amor sem eira
nem beira,
vira o mundo de cabeça
para baixo,
suspende a saia das mulheres,
tira os óculos dos homens,
o amor, seja como for,
é o amor.



(Carlos Drummond de Andrade)
“Se você me encontrar assim
Meio distante
Torcendo cacho
Olhando o chão
É que eu tô pensando
Num lugar melhor
Ou eu tô amando
E isso é bem pior”



(Cazuza)

Cogito

Eu sou como eu sou
Pronome
Pessoal intransferível
Do homem que iniciei
Na medida do possível

Eu sou como eu sou
Agora
Sem grandes segredos dantes
Sem novos secretos dentes
Nesta hora

Eu sou como eu sou
Presente
Desferrolhado indecente
Feito um pedaço de mim

Eu sou como eu sou
Vidente
E vivo tranquilamente
Todas as horas do fim



(Torquato Neto)
(Coração)
bata e se dê o direito de gostar de alguém
que eu dou um jeito de gostar também
sou teu companheiro até no sofrer
mas vê se de vez em quando, em vez de chorar
você ri um pouco que é pra compensar
toda essa tristeza que é de nós dois



(Pedro Luis e a Parede)
Silêncio por favor
enquanto esqueço um pouco
a dor no peito

Não diga nada
sobre os meus defeitos
e não me lembro mais
quem me deixou assim

Hoje eu quero apenas
uma pausa de mil compassos
para ver as meninas
e nada mais nos braços

Quem sabe de tudo não fale
Quem não sabe nada se cale
Se for preciso eu repito

Porque hoje eu vou fazer
Ao meu jeito eu vou fazer
Um samba sobre o infinito


(Paulinho da Viola)

Durma medo meu

Todo o chão se abre
No escuro, se acostuma
Às vezes a coragem é como quando a nova lua
Somos a discórdia
E o perdão
E nos esquecemos da cor que tinha o céu, assim
Como a saudade
Ou uma frase perdida
Durma, Medo Meu
Durma, Medo Meu
Hmmm, não
Às vezes um "não sei"
Janela, madrugada, luz tardia
E o medo nos acorda
Pára e bate o coração
Em pura disritmia
O medo amedronta o medo
Vela, madrugada, dia, assim
Como a saudade
Ou uma frase perdida
Durma, Medo Meu
Durma, Medo Meu


(O Teatro Mágico)
"Quando você for embora,
moça branca como a neve,
me leve.

Se no coração
não possa por acaso me levar
moça de sonho e de neve,
me leve no seu lembrar.

E se aí também não possa
por tanta coisa que leve
já viva em seu pensamento,
menina branca de neve,
me leve no esquecimento."



Ferreira Gullar
´´..E mesmo que eu não te veja
Posso sentir quando pensa em mim
É como não ver o sol
Mas ter certeza que está lá
Transformando a noite em dia
Tristezas em alegrias
E aquilo que era vazio
Foi embora pra não voltar mais

Queria saber voar
Pra lá do alto poder ver você
Te ver sorrir, te ver sonhar
Coisas lindas quero te dizer
E se um anjo encontrar
Eu vou pedir pra ele te proteger...´´

O que me importa

O que me importa seu carinho agora?Se é muito tarde para amar você.
O que me importa se você me adora?Se já não há razão para lhe querer.
O que me importa ver você sofrer assim?Se quando eu lhe quis você nem mesmo soube dar amor.
O que me importa ver você chorando?Se tantas vezes eu chorei também.
O que me importa sua voz chamando?Se pra você jamais eu fui alguém.
O que me importa essa tristeza em seu olhar?Se o meu olhar tem mais tristezas pra chorar que o seu.
O que me importa ver você tão triste?Se triste fui e você nem ligou.
O que me importa o seu carinho agora?Se para mim a vida terminou.


♪ Marisa Monte ♪

Se

se por acaso
a gente se cruzasse
ia ser um caso sério
você ia rir até amanhecer
eu ia ir até acontecer
de dia um improviso
de noite uma farra
a gente ia viver
com garra

eu ia tirar de ouvido
todos os sentidos
ia ser tão divertido
tocar um solo em dueto

ia ser um riso
ia ser um gozo
ia ser todo dia
a mesma folia
até deixar de ser poesia
e virar tédio
e nem o meu melhor vestido
era remédio

daí vá ficando por aí
eu vou ficando por aqui
evitando
desviando
sempre pensando
se por acaso
a gente se cruzasse...


{. Alice Ruiz .}
— E você, por que desvia o olhar?
(Porque eu tenho medo de altura. Tenho medo de cair para dentro de você. Há nos seus olhos castanhos certos desenhos que me lembram montanhas, cordilheiras vistas do alto, em miniatura. Então, eu desvio os meus olhos para amarra-los em qualquer pedra no chão e me salvar do amor. Mas, hoje, não encontraram pedra. Encontraram flor. E eu me agarrei às pétalas o mais que pude, sem sequer perceber que estava plantada num desses abismos, dentro dos seus olhos.)
— Ah. Porque eu sou tímida.
São demais os perigos desta vida
Para quem tem paixão, principalmente
Quando uma lua surge de repente
E se deixa no céu, como esquecida.

E se ao luar que atua desvairado
Vem se unir uma música qualquer
Aí então é preciso ter cuidado
Porque deve andar perto uma mulher.

Deve andar perto uma mulher que é feita
De música, luar e sentimento
E que a vida não quer, de tão perfeita.

Uma mulher que é como a própria Lua:
Tão linda que só espalha sofrimento
Tão cheia de pudor que vive nua.
Eu sou a areia da ampulheta
O lado mais leve da balança
Cão vira-lata amordaçado
Fusca entre cadilacs
Morador do lado errado
Revólver de espoleta
Mais um do bloco dos sabotados
Da trovoada o pára-raios
Dos trovões
E lá vou eu , examinando
espionando
Vou tachado
Sou pesado - empacotado
rotulado
lacrado e despachado
numerado e condenado
censurado e ultrajado
Meu povo!
Como nos deixamos cair
em tamanha abjeção??



(Raul Seixas)
"O que tu viste amargo,
Doloroso,
Difícil,
O que tu viste breve,
O que tu viste inútil
Foi o que viram os teus olhos humanos,
Esquecidos...
Enganados...
No momento da tua renúncia
Estende sobre a vida
Os teus olhos
E tu verás o que vias:
MAS TU VERÁS MELHOR..."



(Cecília Meireles)
E de agora em diante teria sido decretado o amor sem problemas
E seriam vitrines nos olhos, e as almas vagariam sem medo
E de agora em diante seria pra sempre o que pra sempre acabara
E seria tão puro o desejo dos homens,
Que dionisio enlaçaria a virgem com braços enternecidos
E aplaudiríamos, calmos e frenéticos como um são francisco febril
E de agora em diante pra trás não haveria
Não mais a virtude dos fortes, mas o mérito dos suaves
O homem feminino e a mulher guerreira
O amor comunitário, sem ciúmes
Dariam as mãos as moças que amo e brincariam de roda em volta de minha preferida
E um artesão criança esculpiria flores nos cabelos e um sorriso sincero no rosto
E de agora em diante mahatma ghandi tava vivo pra sempre e jesus era hippie, Beethoven era roqueiro e lenon era como nós
E se não desse certo, de agora em diante, ao menos teríamos tentando.



Oswaldo
Quem nunca viu
que a flor, a faca e a fera
tanto fez como tanto faz,
e a forte flor que a faca faz
na fraca carne,
um pouco menos, um pouco mais,
quem nunca viu
a ternura que vai
no fio da lâmina samurai,
esse, nunca vai ser capaz.


(Paulo Leminski )
Não estejas longe de mim um só dia, porque como,
porque, não sei dizê-lo, é comprido o dia,
e te estarei esperando como nas estações
quando em alguma parte dormitaram os trens.

Não te vás por uma hora porque então
nessa hora se juntam as gotas do desvelo
e talvez toda a fumaça que anda buscando casa
venha matar ainda meu coração perdido.

Ai que não se quebrante tua silhueta na areia,
ai que não voem tuas pálpebras na ausência:
não te vás por um minuto, bem amada,
porque nesse minuto terás ido tão longe
que eu cruzarei toda a terra perguntando
se voltarás ou se me deixarás morrendo.


Pablo Neruda

quarta-feira, 18 de julho de 2007

Sua pressa sua prece

"nenhum predicado será prejudicado
nem tampouco a vírgula, nem a crase nem a frase e ponto final!
afinal, a má gramática da vida nos põe entre pausas, entre vírgula
se estar entre vírgulas é aposto
e eu aposto o oposto que vou cativar a todos
sendo apenas um sujeito simples
um sujeito e sua oração
sua pressa e sua prece
que a regência da paz sirva a todos nós... cegos ou não
que enxerguemos o fato
de termos acessórios para nossa oração
separados ou adjuntos, nominais ou não
façamos parte do contexto da crônica"

domingo, 1 de julho de 2007

Auto-retrato

Provinciano que nunca soube
Escolher bem uma gravata;
Pernambucano a quem repugna
A faca do pernambucano;
Poeta ruim que na arte da prosa
Envelheceu na infância da arte,
E até mesmo escrevendo crônicas
Ficou cronista de província;
Arquiteto falhado, músico
Falhado (engoliu um dia
Um piano, mas o teclado
Ficou de fora); sem família,
Religião ou filosofia;
Mal tendo a inquietação de espírito
Que vem do sobrenatural,
E em matéria de profissão
Um tísico profissional.


Manuel Bandeira

O Anel de Vidro

Aquele pequenino anel que tu me deste,
- Ai de mim - era vidro e logo se quebrou
Assim também o eterno amor que prometeste,
- Eterno! era bem pouco e cedo se acabou.

Frágil penhor que foi do amor que me tiveste,
Símbolo da afeição que o tempo aniquilou,
-Aquele pequenino anel que tu me deste,
- Ai de mim - era vidro e logo se quebrou

Não me turbou, porém, o despeito que investe
Gritando maldições contra aquilo que amou.
De ti conservo no peito a saudade celeste
Como também guardei o pó que me ficou
Daquele pequenino anel que tu me deste


Manuel Bandeira

Um dia

Um dia descobrimos que beijar uma pessoa para esquecer outra, é bobagem.
Você não só não esquece a outra pessoa como pensa muito mais nela...
Um dia nós percebemos que as mulheres tem extinto "caçador" e fazem qualquer homem sofrer...
Um dia descobrimos que se apaixonar é inevitável...
Um dia percebemos que as melhores provas de amor são as mais simples...
Um dia percebemos que o comum não nos atrai...
Um dia saberemos que ser classificado como o "bonzinho" não é bom...
Um dia perceberemos que a pessoa que nunca te liga é a que mais pensa em você...
Um dia saberemos a importância da frase: "Tu se tornas eternamente responsável por aquilo que cativas..."
Um dia percebemos que somos muito importante para alguém mas não damos valor a isso...
Um dia percebemos como aquele amigo faz falta, mas ai já é tarde demais...
Enfim...
um dia descobrimos que apesar de viver quase um século
esse tempo todo não é suficiente
para realizarmos todos os nossos sonhos,
para beijarmos todas as bocas que nos atraem,
para dizer tudo o que tem que ser dito..
O jeito é: ou nos conformamos com a falta de algumas coisas na nossa vida ou lutar para realizar todas as nossas loucuras...
Quem não compreende um olhar tampouco compreenderá uma longa explicação.



Mário Quintana

Dos nossos males

A nós bastem nossos próprios ais,
Que a ninguém sua cruz é pequenina.
Por pior que seja a situação da China,
Os nossos calos doem muito mais...



Mário Quintana

Disfarce

Cansado da sua beleza angelical, o Anjo vivia ensaiando caretas diante do espelho. Até que conseguiu a obra-prima do horror. Veio, assim, dar uma volta pela Terra. E Lili, a primeira meninazinha que o avistou, põe-se a gritar da porta para dentro de casa: "Mamãe! Mamãe! Vem ver como o Frankenstein está bonito hoje!"



Mário Quintana

Os Degraus

Não desças os degraus do sonho
Para não despertar os monstros.
Não subas aos sótãos - onde
Os deuses, por trás das suas máscaras,
Ocultam o próprio enigma.
Não desças, não subas, fica.
O mistério está é na tua vida!
E é um sonho louco este nosso mundo...



Mário Quintana

Canção do Amor Imprevisto

Eu sou um homem fechado.
O mundo me tornou egoísta e mau.
E minha poesia é um vicio triste,
Desesperado e solitário
Que eu faço tudo por abafar.
Mas tu apareceste com tua boca fresca de madrugada,
Com teu passo leve,
Com esses teus cabelos...
E o homem taciturno ficou imóvel, sem compreender
nada, numa alegria atônita...
A súbita alegria de um espantalho inútil
Aonde viessem pousar os passarinhos!



Mário Quintana

Canção da Garoa

Em cima do meu telhado,
Pirulin lulin lulin,
Um anjo, todo molhado,
Soluça no seu flautim.

O relógio vai bater;
As molas rangem sem fim.
O retrato na parede
Fica olhando para mim.

E chove sem saber por quê...
E tudo foi sempre assim!
Parece que vou sofrer:
Pirulin lulin lulin...


Mário Quintana

Bilhete

Se tu me amas, ama-me baixinho
Não o grites de cima dos telhados
Deixa em paz os passarinhos
Deixa em paz a mim!
Se me queres,
enfim,
tem de ser bem devagarinho, Amada,
que a vida é breve, e o amor mais breve ainda...


Mário Quintana

O Baú

Como estranhas lembranças de outras vidas,
Que outros viveram, num estranho mundo,
Quantas coisas perdidas e esquecidas
No teu baú de espantos... Bem no fundo,
Uma boneca toda estraçalhada!
(isto não são brinquedos de menino...
alguma coisa deve estar errada)
mas o teu coração em desatino
te traz de súbito uma idéia louca:
é ela, sim! Só pode ser aquela,
a jamais esquecida Bem-Amada.
E em vão tentas lembrar o nome dela...
E em vão ela te fita... e a sua boca
Tenta sorrir-te mas está quebrada!


Mário Quintana

O Auto-retrato

No retrato que me faço
- traço a traço -
às vezes me pinto nuvem,
às vezes me pinto árvore...

às vezes me pinto coisas
de que nem há mais lembrança...
ou coisas que não existem
mas que um dia existirão...

e, desta lida, em que busco
- pouco a pouco -
minha eterna semelhança,

no final, que restará?
Um desenho de criança...
Terminado por um louco!


Mário Quintana

Amor é síntese

Por favor não me analise
Não fique procurando cada ponto fraco meu
Se ninguém resiste a uma análise profunda
Quanto mais eu
Ciumento, exigente, inseguro, carente
Todo cheio de marcas que a vida deixou
Vejo em cada grito de exigência
Um pedido de carência, um pedido de amor
Amor é síntese
É uma integração de dados
Não há que tirar nem pôr
Não me corte em fatias
Ninguém consegue abraçar um pedaço
Me envolva todo em seus braço
E eu serei perfeito amor.


Mário Quintana

Borboletas

Com o tempo, você vai percebendo que,
para ser feliz com uma outra pessoa
você precisa, em primeiro lugar,
não precisar dela.

Percebe, também, que
aquela pessoa que você ama
(ou acha que ama)
e que não quer nada com você,
definitivamente, não é o homem
(ou a mulher) da sua vida.

Você aprende a gostar de você,
a cuidar de você, principalmente,
a gostar de quem também gosta de você.

O segredo é não correr atrás das borboletas...
é cuidar do jardim
para que elas venham até você.
No final das contas, você vai achar
não quem você estava procurando...
mas quem estava procurando por você.


[MÁRIO QUITANA]

Para a liberdade e luta

me enterrem com os trotskistas
na cova comum dos idealistas
onde jazem aqueles
que o poder não corrompeu

me enterrem com meu coração
na beira do rio
onde o joelho ferido
tocou a pedra da paixão


Paulo Leminski

Um homem com uma dor

um homem com uma dor
é muito mais elegante
caminha assim de lado
como se chegando atrasado
andasse mais adiante

carrega o peso da dor
como se portasse medalhas
uma coroa um milhão de dólares
ou coisa que os valha

ópios édens analgésicos
não me toquem nessa dor
ela é tudo que me sobra sofrer,
vai ser minha última obra


Paulo Leminski

lembrem de mim

lembrem de mim
como de um
que ouvia a chuva
como quem assiste missa
como quem hesita, mestiça,
entre a pressa e a preguiça


Paulo Leminski

enchantagem

de tanto não fazer nada
acabo de ser culpado de tudo
esperanças, cheguei
tarde demais como uma lágrima
de tanto fazer tudo parecer perfeito
você pode ficar louco
ou para todos os efeitos
suspeito
de ser verbo sem sujeito
pense um pouco
beba bastante
depois me conte direito
que aconteça o contrário
custe o que custar
deseja
quem quer que seja
tem calendário de tristezas
celebrar
tanto evitar o inevitável
in vino veritas
me parece
verdade
o pau na vida
o vinagre
vinho suave
pense e te pareça
senão eu te invento por toda a eternidade



Paulo Leminski

Amei Tanto

Nunca fui covarde
Mas agora é tarde
Amei tanto
Que agora nem sei mais chorar

Vivi te buscando
Vivi te encontrando
Vivi te perdendo
Ah, coração, infeliz até quando?
Para ser feliz
Tu vais morrer de dor

Amei tanto
Que agora nem sei mais chorar

Nunca fui covarde
Mas agora é tarde
É tarde demais enfim
A solidão é o fim de quem ama
A chama se esvai, a noite cai em mim


[Vinicius de Moraes]

Além Do Tempo

Esse amor sem fim, onde andará?
Que eu busco tanto e nunca está
E não me sai do pensamento
Sempre, sempre longe

Esse amor tão lindo que se esconde
Nos confins do não sei onde
Vive em mim além do tempo
Longe, longe, onde?

Por que não me surges nessa hora
Como um sol
Como o sol no mar
Quando vem a aurora

Esse amor que o amor me prometeu
E que até hoje não me deu
Por que não está ao lado meu?

Esse amor sem fim, onde andará?
Esse amor, meu amor,
Onde andará?


[Vinicius de Moraes]

Memória

Amar o perdido
deixa confundido
este coração.

Nada pode o olvido
contra o sem sentido
apelo do Não.

As coisas tangíveis
tornam-se insensíveis
à palma da mão

Mas as coisas findas
muito mais que lindas,
essas ficarão.


Carlos Drummond de Andrade

Em face dos últimos acontecimentos

Oh! sejamos pornográficos
(docemente pornográficos).
Por que seremos mais castos
Que o nosso avô português?

Oh ! sejamos navegantes,
bandeirantes e guerreiros,
sejamos tudo que quiserem,
sobretudo pornográficos.

A tarde pode ser triste
e as mulheres podem doer
como dói um soco no olho
(pornográficos, pornográficos).

Teus amigos estão sorrindo
de tua última resolução.
Pensavam que o suicídio
Fosse a última resolução.
Não compreendem, coitados
que o melhor é ser pornográfico.

Propõe isso a teu vizinho,
ao condutor do teu bonde,
a todas as criaturas
que são inúteis e existem,
propõe ao homem de óculos
e à mulher da trouxa de roupa.
Dize a todos: Meus irmãos,
não quereis ser pornográficos?


Carlos Drummond de Andrade

Desejos

Desejo a você
Fruto do mato
Cheiro de jardim
Namoro no portão
Domingo sem chuva
Segunda sem mau humor
Sábado com seu amor
Filme do Carlitos
Chope com amigos
Crônica de Rubem Braga
Viver sem inimigos
Filme antigo na TV
Ter uma pessoa especial
E que ela goste de você
Música de Tom com letra de Chico
Frango caipira em pensão do interior
Ouvir uma palavra amável
Ter uma surpresa agradável
Ver a Banda passar
Noite de lua Cheia
Rever uma velha amizade
Ter fé em Deus
Não Ter que ouvir a palavra não
Nem nunca, nem jamais e adeus.
Rir como criança
Ouvir canto de passarinho
Sarar de resfriado
Escrever um poema de Amor
Que nunca será rasgado
Formar um par ideal
Tomar banho de cachoeira
Pegar um bronzeado legal
Aprender um nova canção
Esperar alguém na estação
Queijo com goiabada
Pôr-do-Sol na roça
Uma festa
Um violão
Uma seresta
Recordar um amor antigo
Ter um ombro sempre amigo
Bater palmas de alegria
Uma tarde amena
Calçar um velho chinelo
Sentar numa velha poltrona
Tocar violão para alguém
Ouvir a chuva no telhado
Vinho branco
Bolero de Ravel
E muito carinho meu.


Carlos Drummond de Andrade

Basta pensar em sentir

Basta pensar em sentir
Para sentir em pensar.

Meu coração faz sorrir
Meu coração a chorar.

Depois de parar de andar,
Depois de ficar e ir,

Hei de ser quem vai chegar
Para ser quem quer partir.

Viver é não conseguir.


Fernando Pessoa

O Amor

O amor, quando se revela,
Não se sabe revelar.
Sabe bem olhar p'ra ela,
Mas não lhe sabe falar.
Quem quer dizer o que sente
Não sabe o que há de *dizer.
Fala: parece que mente
Cala: parece esquecer

Ah, mas se ela adivinhasse,
Se pudesse ouvir o olhar,
E se um olhar lhe bastasse
Pr'a saber que a estão a amar!

Mas quem sente muito, cala;
Quem quer dizer quanto sente
Fica sem alma nem fala,
Fica só, inteiramente!

Mas se isto puder contar-lhe
O que não lhe ouso contar,
Já não terei que falar-lhe
Porque lhe estou a falar...


Fernando Pessoa

Dizem que finjo ou minto

Dizem que finjo ou minto
Tudo que escrevo. Não.
Eu simplesmente sinto
Com a imaginação.
Não uso o coração.

Tudo o que sonho ou passo,
O que me falha ou finda,
É como que um terraço
Sobre outra coisa ainda.
Essa coisa é que é linda.

Por isso escrevo em meio
Do que não está ao pé,
Livre do meu enleio,
Sério do que não é,
Sentir, sinta quem lê !


Fernando Pessoa

Subversiva

A poesia
quando chega
não respeita nada.
Nem pai nem mãe.
Quando ela chega
de qualquer de seus abismos
desconhece o Estado e a Sociedade Civil
infringe o Código de Águas
relincha
como puta
nova
em frente ao Palácio da Alvorada.
E só depois
reconsidera: beija
nos olhos os que ganham mal
embala no colo
os que têm sede de felicidade
e de justiça
E promete incendiar o país


Ferreira Gular

Dois e dois: quatro

Como dois e dois são quatro
Sei que a vida vale a pena
Embora o pão seja caro
E a liberdade pequena

Como teus olhos são claros
E a tua pele, morena
como é azul o oceano
E a lagoa, serena

Como um tempo de alegria
Por trás do terror me acena
E a noite carrega o dia
No seu colo de açucena

- sei que dois e dois são quatro
sei que a vida vale a pena
mesmo que o pão seja caro
e a liberdade pequena.


Ferreira Gular

Cantada

Você é mais bonita que uma bola prateada
de papel de cigarro
Você é mais bonita que uma poça dágua límpida
num lugar escondido
Você é mais bonita que uma zebra
que um filhote de onça
que um Boeing 707 em pleno ar
Você é mais bonita que um jardim florido
em frente ao mar em Ipanema
Você é mais bonita que uma refinaria da Petrobrás
de noitemais bonita que Ursula Andress
que o Palácio da Alvorada
mais bonita que a alvorada
que o mar azul-safira
da República Dominicana
Olha,você é tão bonita quanto o Rio de Janeiro
em maio
e quase tão bonita
quanto a Revolução Cubana


Ferreira Gular

Cantiga para não morrer

Quando você for se embora,
moça branca como a neve,
me leve.
Se acaso você não possa
me carregar pela mão,
menina branca de neve,
me leve no coração.
Se no coração não possa
por acaso me levar,
moça de sonho e de neve,
me leve no seu lembrar.
E se aí também não possa
por tanta coisa que leve
já viva em seu pensamento,
menina branca de neve,
me leve no esquecimento.


Ferreira Gular
Dorme enquanto eu velo...
Deixa-me sonhar...
Nada em mim é risonho.
Quero-te para sonho,
Não para te amar.
A tua carne calma
É fria em meu querer.
Os meus desejos são cansaços.
Nem quero ter nos braços
Meu sonho do teu ser.
Dorme, dorme.
Vaga em teu sorrir...
Sonho-te tão atento
Que o sonho é encantamento
E eu sonho sem sentir.


Fernando Pessoa
"Se o seu problema tem solução, então não há com o que se preocupar. E se o seu problema não tem solução, toda preocupação será em vão."


(Provérbio Tibetano)
"Se minha Teoria da Relatividade estiver correta, a Alemanha dirá que sou alemão e a França me declarará um cidadão do mundo. Mas, se não estiver, a França dirá que sou alemão e os alemães dirão que sou judeu."


Albert Einstein
"Se você tivesse acreditado na minha brincadeira de dizer verdades, teria ouvido verdades que teimo em dizer brincando, falei muitas vezes como o palhaço, mas nunca desacreditei da seriedade da platéia que sorria."


Charles Chaplin
Cada qual sabe amar a seu modo;
o modo pouco importa;
o essencial é que saiba amar.


Machado de Assis
Ser profundamente amado por alguém nos dá força;
Amar alguém profundamente nos dá coragem.


Lao-Tseu
Existem amores...
e existe um amor especial,
apenas uma vez em nossas vidas...
este tipo de amor pertence ao Céu,
é incondicional e ele será para sempre...
como uma marca cósmica,
uma infinita lágrima de alegria
e um abraço sem fim!
O difícil é descobri-lo, discerní-lo,
em meio às tempestades do nosso coração.


Autor Desconhecido
"A glória da amizade não é a mão estendida,
nem o sorriso carinhoso,
nem mesmo a delícia da companhia.
É a inspiração espiritual que vem
quando você descobre que alguém acredita e confia em você."


Ralph Waldo Emerson
"Se eu pudesse deixar algum presente a você,
deixaria aceso o sentimento de amor à vida dos seres humanos.
A consciência de aprender tudo o que nos foi ensinado pelo tempo afora.
Lembraria os erros que foram cometidos, como sinais para que não mais se repetissem.
A capacidade de escolher novos rumos.
Deixaria para você, se pudesse, o respeito aquilo que é indispensável:
alem do pão, o trabalho e a ação.
E, quando tudo mais faltasse, para você eu deixaria, se pudesse, um segredo.
O de buscar no interior de si mesmo a resposta para encontrar a saída."


Mahatma Ghandi

Traduzir-se

Uma parte de mim
é todo mundo:
outra parte é ninguém:
fundo sem fundo
uma parte de mim
é multidão:
outra parte estranheza
e solidão
uma parte de mim
pesa, pondera:
outra parte delira.
Uma parte de mim
almoça e janta:
outra parte
se espanta.
Uma parte de mim
é permanente:
outra parte
se sabe de repente.
Uma parte de mim
é só vertigem:
outra parte,
linguagem.
Traduzir uma parte
na outra parte
- que é questão
de vida ou morte -
será arte?


Ferreira Gular